Ela se sentia cercada desde pequena. Na verdade perdera há muito
a referência de liberdade. Chega a imaginar que nunca fora livre afinal. Suas
lembranças mais distantes remetem sempre aos muros; às cadeias que a cercavam.
Sua mãe, figura sempre presente em sua vida, cuidava em
minúcias das coisas que ouvia, que lia, assistia e até mesmo, das coisas que
falava. De um jeito ameaçadoramente doce lhe olhava e direcionava cada
pensamento convergindo para o que ela deveria crer! Às vezes sentia-se
enclausurada literalmente, como num mosteiro ás avessas.
O estranho numa mulher tão doce e gentil como a mamãe, era
seu perfil quase patológico em garantir que suas lições eram aprendidas por
osmose, à exaustão. Não freqüentou escola. Mamãe dizia que ‘o saber corrompia a
boa alma ignorante’, mas não era só ela quem cuidava de seus ensinos. Alguns
professores de modos tão particulares como os de sua mãe, faziam-lhe companhia
durante o dia.
Homens de jeitos enigmáticos, de feições estranhas, cercados
de suas literaturas; principalmente dum livro negro arcaico, de páginas tons de
sépia e cheiro ocre.
Crescera em meio a tanto conhecimento que os jovens de sua
idade jamais teriam acesso. Um de seus professores, talvez um tanto rebelde lhe
apresentou às grandes obras dos clássicos romancistas.
Encontrou-se com Shakespeare, espantou-se com Verne e
apaixonou-se com Dumas (o filho) na verdade por uma obra em especial “A Dama
das Camélias”...
Algo tão contraditório ao seu ensino fundamentalista,
verdadeiro ultraje à sabedoria pura que lhe fora concedida.
Mas prossegue sua contemplação da vida sob a ótica de seus
mestres.
Espantada ficou quando descobriu por fim que esse
ensinamento fazia parte não só da formação de moça qualquer, importante apenas
para sua família. Mas fazia parte de uma árdua etapa que levaria uma jovem
tímida e originalmente sem grandes sonhos, além dos muros delineados de sua
gente.
Percebeu que seus mentores eram na verdade parte de um culto
ao conhecimento do inconcebível, e que cada etapa de seus ensinamentos faziam-na
mais preparada para assumir grandes responsabilidades e tamanho poder sequer
imaginado por menina antes tão simplória. Isso mesmo... ‘antes!’
Agora seduzida pelo poder do conhecimento e pelo desejo de
dominar, seus modos pouco lembravam a criança tímida do passado. Uma mulher
forte e decidida ergue-se para conquistar macabros ideais.
Já não sente mais as correntes que lhe cercavam os pulsos ou
paredes que lhe comprimiam o corpo. Ela agora é quem puxa as correntes, é quem
se assenta sobre a muralha.
Insana e cega pelo poder e autoridade, caminha a passos
largos para dominar seu propósito...
Uma dama sem dúvida, mas a flor que melhor a define hoje
seria uma tulipa... Negra!
Wendel Bernardes
Wendel Bernardes
A cada dia q passa eu me sinto mais dona do Lendas...kk.
ResponderExcluirAurélio, é impressionante como eu me identifico com ele!!!
Bjs.
Esse texto (embora fictício) teve inspiração!
ResponderExcluirAuréilo, passei por aqui..
ResponderExcluirVenha sempre que quiser, é uma honra!
ExcluirAurélio, to na área..kk..
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