quarta-feira, 20 de março de 2013

Eles Estão entre Nós... O Grande Kenoah.



Um braço ergue-se empunhando aço nu. Ouve-se logo em seguida um brado que amedronta a alma dos mais bravos. Certamente esse grito de guerra não é em vão... Na verdade, nunca foi!

JERUSALÉM – SÉC. I A.C.
As ruas empoeiradas e escuras da “Cidade Santa” guardam segredos inacreditáveis. Aaliyah tenta voltar para casa, juntos dos seus, mas sente que está sendo seguida. Ela possui apenas dezessete anos e nunca deveria sair de casa desacompanhada, isso é uma desonra para uma moça de família, principalmente a essa hora da noite, porém isso se fez necessário. Aaliyah tem que sair a essa hora para buscar um pouco de comida na casa de seu tio Baruch.
A fome, ainda mais negra que a noite, a impulsiona a prosseguir. Ela está só pelos mesmos motivos que caminha a essas horas. Medo e morte.

Seu pai fora morto, pois se desconfiava que ele fizesse parte da nova seita dos Caminhantes. Bárbara e completamente brutal, a vida fez com que essa pequena flor do deserto se tornasse uma mulher em pouquíssimo tempo.  A comida é para partilhar com sua mãe Adina, às portas da morte.

A jovem tem medo de perecer pela peste que assola sua mãe. Tem medo de morrer ao fio da espada dalgum centurião subornado por algum dos herdeiros culturais e religiosos dum tal Caifás, que no passado recente, fora responsável pela morte de certo profeta.
E seu medo não cessa...
Teme ainda morrer de fome, teme ser pega por algum vilão bêbado sorrateiro...
Porém, e pequena mal imagina que seus medos deveriam potencializar-se. Ah, se ela soubesse...

Ela apressa o passo como que percebendo alguma atrocidade latente. Dobra esquinas e esgueira-se apenas com pedaço de pão, um tanto de azeite e duas tâmaras.
“Oh, Deus... Ajude-me!”

Alheia à sua prece, criatura monstruosa e demoníaca decide atacar apenas com um propósito: saciar sua sede de sangue.
A criatura firma sua força em quatro patas, rosna como fera louca e corre como sempre. Seus dentes destroçam carne há séculos, porém, quando a carne em questão se trata de uma jovem e assustada caminhante, tudo se amalgama a um estranho sentimento: o prazer.
Embora a menina sinta um medo que lhe gele a alma – mesmo sem saber do quê – jamais poderia arrazoar do que ela foge. Mas a criatura está cada vez mais perto, cada vez mais próxima de concluir sua sina; saciando sua sede...

Apenas alguns metros para que Aaliyah chegue ao seu destino. Apenas alguns metros para que o terror se apodere dela. Respirações ofegantes. Medo e prazer estão no ar... o demônio salta para seu propósito até que algo lhe corta as entranhas!
A criatura urra banhada duma gosma alaranjada e fétida. Vira-se para contemplar o que a atingira e fita figura gigantesca.  Corpo de bárbaro, rosto de homem, espada de guerreiro: e realmente o é!
Trata-se de Kenoah, um guerreiro celestial temido na terra dos homens, odiado nos baixos e inglórios locais e cantando em seu Reino sobrenatural.

A criatura conhece seu algoz, seus olhos queimam de fúria cega e na única e desesperada tentativa de vencer, lança-se insanamente contra seu oponente. Ele aguarda parado como estátua de mármore com seu aço dourado nas mãos e quando a fera se aproxima ele usa seu próprio peso e impulso para lhe atravessar o corpo demoníaco. Abraça-lhe firmemente e estende suas asas morenas dando impulso e saindo assim do alcance de qualquer olho humano.
Aaliyah? Está segura em casa alimentando sua mãe dessa vez. Isso até que a morte lhe bata a porta em mais uma oportunidade. Porém, se depender de seu mais novo guardião pessoal, nada será tão fácil assim.

Longe dali os sons de guerra se intensificam. Outros braços se erguem, urros demoníacos se fundem aos cânticos de batalha de seres nascidos para tal.
Onde agirão da próxima vez?

Wendel Bernardes.





domingo, 10 de março de 2013

Desejo do Tempo Passado.



Cansado demais, apenas queria deitar-se em sua cama mal feita e dormir profundamente.
O quarto escuro e frio o faz lembrar de pensamentos que o remetem ao passado recente. De alguma forma faz uma prece, pedindo que algo mude seu destino.
Depois de algum tempo de pensamentos correlatos é vencido pelo cansaço.
Seus sonhos são puro drama, quem sabe mimetizados por sua própria psiquê doentia ou por conta de coisas que fizera. O silêncio do ambiente o faz ir ainda mais profundo em seu labirinto pessoal, quem sabe buscando encontrar algo perdido, quem sabe tentando ver-se vencido nos braços de minotauro qualquer...

De súbito, ainda que embevecido pela droga de Morfeu, sente alguém adentrar, ou simplesmente surgir em sua proximidade. Os níveis de sono são rapidamente vencidos até que abre seus olhos agora acostumados à escuridão, procurando pela fonte de tal situação até que:
- Boa noite, ou devo dizer bom dia? Sabe, eu nunca consigo me decidir qual a saudação certa...
- Meu Deus!!!
- Ah, sim... É uma confusão bastante comum, meu amigo. Alguém aparece do nada em seu quarto na madrugada e logo é associado com Deus, ou com algum de seus auxiliares... Quero deixar bem claro que não sou Ele, nem associado a Ele em qualquer esfera!
- Então você é...
- Você não está me ouvindo, amigo?... Disse que não estou associado com Ele em nenhuma esfera, entendeu? Isso quer dizer que não sou esse aí que você pensou... Ora, veja!
- Então quem é você? O que faz aqui? Aliás, como entrou aqui?
- Ahhhhhh.... O delicioso sabor das perguntas certas.
Ele vaga em meio à penumbra até que, quase deslizando, senta-se como um lord na ponta da cama de casal com agora um dono apenas.
- Sou alguém que seu entendimento um tanto curto não irá assimilar muito bem meu caro...
- Como assim?
- Viu? Como eu disse – concluiu ironicamente.
Repentinamente o rosto do estranho se ilumina numa luz tênue que poderia ser ainda mais sutil que pequena chama.
- Sou um discípulo – deveras aplicado, eu diria – do tempo como um todo.
- Isso quer dizer que...
- Que tenho em minhas mãos, caro jovem, o poder de singrar dimensões. Presente, futuro e passado não me são fatos lineares e inacessíveis como a vocês. Isso quer dizer, que posso acessar exatamente qualquer ponto do tempo... Não é maravilhoso?
- Qualquer ponto?
- Sim, desde que seja, digamos; nos últimos cinco mil anos...
- Inacreditável!
- Eu sei meu jovem, para seres como você é completamente inadmissível minha realidade, mas...
- Prove...!

Ele lhe sorri com expressão enigmática enquanto apenas ergue a mão esquerda onde faz revelar estranho anel dourado com ranhuras e lapidações que lembram símbolos místicos, certamente.
E qual surpresa se deu quando o quarto escuro simplesmente tornou-se uma bela varanda em madeira de lei. Redes fixadas nas colunas de jacarandá e cheiro de café fresco e bolo de laranja....
- Essa casa é...
- Sim, da sua adorável e falecida avó... Continue olhando, meu amigo.
A porta lateral se abre revelando duas conhecidas figuras. Uma de cabelos grisalhos cortados na altura da nuca, brincos de pérolas, grandes olhos negros e forte sorriso convidativo.
- Vovó – ele diz boquiaberto.
A outra; menino de calças curtas, cabelo desgrenhado, olhos azuis e bem magrinho. Dessa vez sua já fraca voz se cala diante de sua própria figura na infância. Os cheiros, os sons, a presença dela... Tudo é real, ele sabe muito bem.
E no exato momento em que suas descrenças desaparecem, ele volta ao quarto no mesmo ponto de partida.

- Vejo que nutre uma fé positiva agora, não é mesmo?
- Você provou apenas o que é, e o que possui como dom, mas não explicou o que quer aqui e comigo.
O ser enigmático se energiza com as perguntas de seu companheiro, e agora de pé, passa a descrever:
- Sou um de poucos seres possuidores do poder de fazer almas tristes como você, meu amigo, voltarem a desfrutar de novo da alegria da vida plenamente.

Ele continua a falar, mas agora fita friamente os olhos do jovem.
- Não é preciso o dom que tenho, para saber que sua vida está lançada na dor e amargura de um recente cisma. Sua cama feita para dois, abriga apenas um. Seu olhar perdido procura por alguém que ‘o tempo levou’...
- De fato, mas o que você pretende?
- Pretendo lhe trazer a cura, que tal?
- Cura?
- Sim, lhe presentearei com um poder especial... O poder pelo qual cada homem ou mulher desse planeta hipócrita mataria. O poder em que poetas e filósofos, doentes de angústia, basearam suas mais complexas teorias e poemas.
- Qual poder?
- O poder de voltar atrás... Imagine poder voltar até certo ponto do tempo em que o gesto certo poderia mudar tudo? Trocar seu destino, mexer na sua vida!
- Não é possível!
- Seria dúvida ou medo que lhe assombra, meu caro? Convido-lhe a lançar-se na minha realidade, e veja você mesmo, meu amigo descrente.

O jovem apenas acena positivamente com a cabeça, ato que faz o estranho lord tomá-lo pela mão fazendo-o erguer-se de sua cama.
O ambiente no entorno dessa cena clareia sutilmente, enquanto o enigmático mago do tempo faz descansar em seu dedo anelar esquerdo, antes vazio, anel semelhante ao que ele mesmo usa, apenas um tanto menor e mais simples.

Estranhamente o jovem sente algo correr pelo seu corpo, como uma energia pulsante, que lhe revigora e lhe vicia exatamente naquele instante.
- Sim, meu caro... Isso é poder! Coisa que pouquíssimos privilegiados experimentaram até hoje.
- E agora o que faço?
- Apenas deseje profundamente e você estará exatamente no local e no tempo que quer visitar, se não me engano em seu passado, a tempo de mudar seu futuro que é nosso presente.
- Sim...
- Calma amigo, não deveria se vestir antes?
Foi apenas aí que notara que estava completamente nu, se não fosse o par de meias que calçava.
A ânsia por mudar sua vida lhe fizera cego até mesmo para coisas práticas da vida, então o que seria uma simples nudez?

Devidamente vestido – e perfumado – olha para aquele que é agora seu mestre e pergunta:
- Há algo que eu deveria saber? Algo que não possa realizar?
- Não pode mudar o livre-arbítrio de ninguém, esse poder é desejado até mesmo pelos deuses, mas infelizmente não o possuímos, mas pode fazer exatamente tudo no âmbito natural para mudar seu destino. E deixe de lado seus pudores meu jovem, é mais fácil quando você os abandona...
- Eu o verei de novo?
- Decerto que sim, meu caro.
Ele fecha seus olhos azuis e é lançado num outro ambiente, noutro tempo. Sentiu certo desconforto como os novatos em primeiro voo, apenas potencializado quanticamente, óbvio...
Mas agora está lá... Defronte de velha casa desgastada pelo tempo. Seu corpo, embora contendo a energia de um estro, estava tenso, trêmulo e completamente estranho.
Tocou a campainha e notou surpresa e apaixonada figura em sua direção. Possuía olhos tristes, sorriso de cantos de lábios, cabelos negros, e um desejo enorme de abrir o portão e abraçá-lo por instantes a fio. Foi o que fizeram.
Ele agora sabia o gesto certo para não por tudo a perder... Essa parte foi a mais simples, pois repassou isso em sua mente vezes e vezes. O abraço lhe entorpece até que desperta e está de novo em seu quarto.

Sonho? Não! O anel ainda está em suas mãos e o gosto do beijo e o perfume que emolduraram o encontro ainda estava em sua roupa. Isso mesmo; roupa... Até onde lembra, estava apenas de meias na noite anterior. Foi tudo real.
Tomado por dor terrível tenta remover o anel, lançá-lo longe, mas seu esforço é vão...

- Não faça assim meu amigo.
- Você! Seu cretino mentiroso... Eu estava lá, mas vivi apenas alguns minutos.
- Ora meu amigo, instantes felizes não são melhores do que toda uma vida triste e vã?
- Você me enganou, estou preso a essa realidade não é?
- De fato meu esclarecido pupilo.
- Porque fez isso a mim? O que você ganha com isso?
- Ahhhhhh.... As deliciosas perguntas de novo.
Você ainda faz parte de grupo seleto, porém, diferente de seu mestre que singra milênios, seu poder apenas se limita àquele momento...
- Por quê?
- Foi você quem escolheu. Tinha o poder de estar com quem quisesse em qualquer tempo, mas preferiu ver seu amor e resgatar seus erros. Agora está preso a esses momentos. Foi seu enganoso e desejoso coração que assim o fez.
- Agora estou preso a isso?
- Absolutamente. Você está preso à esse passado há muito tempo. Apenas lhe dei poder para realizar seus desejos mais notórios. Esteve feliz e completo por alguns instantes, não foi?
Quem se lança no amargurado passado, apenas imaginando como tudo seria diferente é escravo desse passado. Pense positivo, pelo menos seus últimos instantes são felizes...

Dito isso, o bruxo temporal se despede acenando-lhe com a cabeça e lhe deixa só com seus pensamentos, enquanto lhe vira as costas, e sente dentro de si o poder ao entorno sendo deslocando pelo jovem quando mais uma vez salta em direção ao passado. Sente que fez um bem quando estabeleceu macabro paradoxo na vida desse – agora – escravo do tempo.

Olha em pequeno bolso interno em seu sobretudo e nota que há ainda muitos anéis do tempo. Vislumbra o futuro e simplesmente some, saltando em direção a ele.
Cuidado com seus desejos e preces...

Wendel Bernardes.


sexta-feira, 8 de março de 2013

Elas...



Elas são mães, filhas, irmãs...
São avós, primas, tias...
Esposas, companheiras, amigas...
São tantas coisas e tão completas, que mesmo os mais brutos
Dependem delas até a alma.

A cada mulher que faz, fez e fará parte de minha vida
Parabéns pelo dia de hoje,
E pelo de amanhã
E depois e depois e depois...

Wendel Bernardes