Quando abriu os pequenos olhos tristes percebeu que não
estava em nenhum lugar familiar. Era, na verdade, uma bucólica paisagem dessas
que povoam as mentes coletivas a respeito do paraíso. Havia sim um clima de
paz, ou quem sabe, na verdade, ausência de guerra. A cena era envolta numa fina
névoa, bela, bailante que trazia um ar misterioso a tudo.
Óbvio que estava preocupado. Perguntava-se se isso era real
e tangível, ou se estava materializando um sonho. Decide levantar-se e sondar o
lugar. Sentia medo, pois vivia algo desconhecido, mas era desbravador por
natureza, não poderia simplesmente deixar o acaso tomar conta de si. Percebeu que
usava roupas leves, como se o motivo de estar ali fosse justamente esse;
caminhar...
Espelhos d’água, pomares, árvores ornamentais. Ruídos de pássaros
e sons de outros animais indicam a vida abundante nesse lugar. Porém nenhum dos
outros sentidos citados lhe rouba mais a atenção que seu olfato. Os cheiros são
arrebatadores; flores, frutas, terra molhada. Todos os odores estranhamente reconfortantes,
característicos de uma parte específica de sua vida: a infância.
Não sabe se se cansou de desbravar o jardim, ou se fora
mesmo vencido pelo excesso de informações contidas desse paraíso, o fato é que,
debaixo de uma arvore ancestral faz seu descanso, deixando seus olhos ainda
desconfiados cerrarem em pausa para arrazoar a respeito do que lhe trouxera
ali. Não saberia precisar o tempo passou, tampouco poderia dizer quanto levou
para perceber novos ruídos ao seu redor; sons de movimentos na grama alta.
Explodiu-se o medo, misturado a uma ponta de esperança, e
despertando do descanso, ao procurar pela origem dos sons nota, não muito
perto, mas nem tão longe, uma figura feminina envolta em paz.
Mas não era qualquer figura, mas alguém muito, muito
familiar.
Possui um sorriso iluminador, cabelos presos sem esforço e
uma bondade exalada nos olhos que lhe fitam.
‘Como pode ser ela? Que saudades...’
Ela lhe chega e o perfume que sentira a vida inteira lhe
atinge como chuva de verão. Porém não lhe diz palavra. Apenas se assenta ao seu
lado e lhe puxa pelo braço trêmulo para confortá-lo em seu colo macio, e confiável.
Ele possui a sensação que o mundo realmente poderia acabar
ali e nada faria em seu pensar mais sentido do que findar seus dias nesse Éden de
sentimentos, matando sua saudade dessa mulher ímpar.
Quando finalmente adormece profundamente sente seus medos
mais cruéis e suas dúvidas mais profundas, serem curadas pela comunhão desse
encontro.
Terapiando o que nunca abrira para ninguém – por não fazer
sentido fazê-lo senão para esse ser – sentia-se entendido em cada palavra que não
disse, em cada atitude que revelou apenas em estar com ela.
Não saberia mais uma vez precisar o tempo que isso levou,
mas acorda cônscio que não foram apenas instantes dadas as circunstâncias. A leveza
do corpo, a força da mente, a coragem para prosseguir. Olha em volta e a bela
paisagem – agora sem a névoa – esconde o lugar que seu anjo particular foi. Mas
sente paz a ponto de não se entristecer mais como foi com sua primeira partida.
Sabia que de alguma forma, era tudo necessário para sua cura. Ensaia um tímido sorriso
deixando seus olhos menos tristes.
Até que percebe agitação numa colina, coisa de uns
quinhentos metros dali, então decide ir ao encontro das pessoas nessa subida, e
no seu caminho ouve voz muito familiar ao seu lado:
-Está pronto?
Ele se assusta tanto pela proximidade, quanto em notar que
conhece não somente a voz desse personagem de sua vida.
-O que você faz aqui?
-Bom, eu estou ‘aqui’ todo esse tempo, nunca saí de perto e foi você
quem quis assim...
-Como assim?
Ele sorri confiante enquanto prossegue sua explicação.
-Eu vim para lhe
ajudar com algumas respostas e uso essa forma tão familiar a você, pois sei que
confia nele e é mais fácil fazer isso por você, como já disse, no seu interior
foi você quem quis assim!
O homem lhe indica o caminho e começam ambos a passear mais
lentamente enquanto aquele ser, notadamente mais elevado, lhe tranqüiliza ao
passo que dúvidas austeras e perguntas recorrentes são respondidas.
-Mas porque tudo tem
sempre que parecer tão difícil? – pergunta o confuso protagonista:
-Nada é tão confuso
para quem enxerga a vida com o olhar do Amor. Se ele rege sua vida, embora
tristezas sejam inevitáveis e as dores até freqüentes, nota-se que tudo é
resultado das escolhas que se faz durante a caminhada, abençoadas por esse
sentimento.
-Você está dizendo que
sofremos porque escolhemos a dor?
-Estou dizendo que, se
o Amor é a meta, nem a dor pode fazê-lo desistir de seus sonhos de nunca estar
só.
Apenas quando ele ouve essas últimas palavras se dá conta
que estava trilhando um caminho errado na vida. Fugia de tudo com medo da dor, mas
notou que ela o seguiria sempre no desvio que escolheu tomar, ou qualquer fosse
seu destino.
Percebera também que não estava morto, e que aquele paraíso nunca
fora o céus, mas que fizera uma estranha, curiosa e indecifrável viagem em si
mesmo e que o saldo foi muito positivo.
O colo da mãe, as palavras do coração... Tudo lhe refez em
força para seguir adiante em seu caminho em direção a ele mesmo!
Wendel Bernardes.
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